Uma funcionária do Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (Dsei-Y), em Roraima, gravou uma conversa com um assessor considerado braço direito do então coordenador da unidade, vinculada ao Ministério da Saúde, que reforça suspeitas de fraude em esquema de fornecimento de medicamentos básicos aos indígenas.
A mulher atuava em área estratégica no distrito, que faz o controle da entrada e saída de medicamentos destinados às aldeias na Terra Indígena Yanomami.
Conforme investigações da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal (MPF), ela teria recebido uma oferta de propina para atestar o ingresso fraudulento de remédios no sistema, em junho de 2022.
No mês seguinte, a funcionária decidiu gravar nova abordagem feita para evidenciar que o esquema seguia ativo. Ela se negou a participar, segundo as investigações.
Uma operação foi deflagrada em 30 de novembro com o propósito de combater o suposto desvio de recursos públicos destinados à compra de medicamentos aos Yanomami.
De acordo com a PF e o MPE, as supostas fraudes resultaram na retenção de medicamentos, em especial vermífugos, o que deixou 10.193 crianças desassistidas. O resultado foi um “aumento de infecções e manifestações de formas graves da doença, com crianças expelindo vermes pela
boca”.
As buscas autorizadas pela Justiça em novembro ocorreram nas casas de dois ex-coordenadores do Dsei Yanomami em Boa Vista. Também foram alvos o ex-assessor Cândido Lira e a empresa fornecedora de medicamentos, Balme Empreendimentos.
Um dos coordenadores do Dsei, Rômulo Pinheiro de Freitas, ocupou o cargo em julho de 2020, nomeado pelo então ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello (PL). Ficou na função até janeiro de 2022, quando foi substituido pelo ex-vereador de Mucajaí, Ramsés Almeida da Silva. A nomeação de Silva foi feita pelo então ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.
Como a Folha mostrou, os ex-dirigentes têm ligações políticas com o senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR).
Freitas, por exemplo, é filho de Socorro Pinheiro que em 2018 concorreu a deputada estadual por Roraima na mesma chapa do senador – todos eles promoveram eventos juntos e dividiram santinhos, como mostram fotos nas redes sociais.
A principal fornecedora para a campanha de Socorro foi uma empresa que está no nome das filhas de Mecias. Já Ramsés Silva tentou se reeleger vereador em Mucajaí pelo Republicanos, mas acabou como suplente. Eles aparecem juntos em fotos de eventos públicos e reuniões.
Era de Ramsés Silva que Cândido Lira era assessor. A gravação indica que o funcionário agiu sob ordem do coordenador do distrito conforme relatórios da PF e da Procuradoria, que também citam favorecimento à Balme Empreendimentos.
As investigações também levaram em conta os depoimentos de diferentes funcionários do Dsei
que atuaram na área de controle de medicamentos. Os testemunhos detalham as relações entre os suspeitos e a insistência para uma suposta inclusão fraudulenta de estoques, mesmo sem remessa do material.
A gravação feita reforça o teor dos depoimentos prestados por outros funcionários e indica uma suposta tentativa de chantagem contra a servidora.
Conforme os policiais o prejuízo aos cofres públicos em uma única entrega fraudulenta foi de R$ 572,5 mil.
Para o MPE, ficou caracterizado um “cenário degrave desorganização e corrupção de agentes do DSEI Yanomami nos anos de 2021 e 2022”, com superfaturamento de contrato e fraude no recebimento de medicamentos.
Fonte: Folha de S. Paulo
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