A Tecnóloga em Gestão Pública, Sandra dos Santos, tinha 33 anos, havia acabado de “nascer” no dia 6 de 2012 e fez história. Mulher trans, foi nesta data que ela conseguiu a tão esperada retificação do nome no registro civil. Seu caso se tornou o primeiro de Roraima. A Defensoria Pública de Roraima (DPE-RR) quem protocolou a ação.
“Ter meus documentos civis e profissionais com o nome que escolhi para mim e que corresponde à minha identidade de gênero foi a melhor coisa que aconteceu comigo”, disse.
Contudo, antes dessa mudança, Sandra enfrentava constrangimentos frequentes. Especialmente ao acessar serviços básicos que são direitos de todo cidadão e cidadã. Em unidades de saúde, instituições de ensino, entrevistas de trabalho e nos aeroportos, era preciso explicar detalhes íntimos de sua vida para justificar o nome masculino presente em seu RG.
“Tudo que eu queria era ter uma vida normal como qualquer outra cidadã, sem ter que explicar maiores detalhes da minha intimidade na hora de apresentar meu documento de identificação”, relembra Sandra, que hoje tem 45 anos.
Antes da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2018, que autorizou a retificação de nome e gênero sem necessidade de processos judiciais, muitos juízes, tanto em Roraima quanto em outras partes do Brasil, exigiam laudos médicos, psicológicos, outros documentos e testemunhas para deferir ou negar o pedido de alteração de registro civil, tornando o processo tortuoso.
Do mesmo modo, o subdefensor público-geral, Natanael Ferreira, que atuou no caso, foi fundamental para Sandra conseguir essa vitória. Ele descreveu o processo como um dos momentos mais emocionantes de sua carreira e destacou a importância da sensibilidade ao lidar com dramas pessoais profundos.
“Se você não tiver sensibilidade, não percebe o tamanho do dano daquela pessoa. Viver só vive quem passa, quem sofre aquele drama.”
Na época, a jurisprudência sobre o tema ainda era vacilante, marcada por muitos tabus e preconceitos. Segundo o defensor, a DPE-RR foi pioneira ao trazer o primeiro processo judicial do estado tratando desse tema. “Era um tema muito espinhoso porque você ia tratar sobre valores muito intrínsecos à pessoa.
A Defensoria trouxe o primeiro processo judicial sobre esse tema para a justiça de Roraima.”
Natanael ressaltou a importância de abordar o caso sob uma perspectiva humanística, baseando-se no princípio da dignidade da pessoa humana. Ele comparou o sofrimento de Sandra “a um estado constante de tortura imposto pelo preconceito, tabu e falta de compreensão sobre o tema.”
O processo enfrentou obstáculos, incluindo a resistência do Ministério Público em permitir a mudança de gênero sem cirurgia de redesignação. No entanto, os depoimentos emocionantes de Sandra e de sua mãe sensibilizaram o juiz Erasmo Hallysson S. de Campos, resultando na decisão de reconhecer seu novo nome.
“Conseguimos sensibilizar o juiz e a decisão saiu na própria audiência reconhecendo o nome dela, porém o gênero permaneceu. É uma história que me emociona muito, até hoje,” disse o defensor.
Conforme o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), atualmente a mudança de nome e gênero nos documentos é possível sem a necessidade de ação judicial. Qualquer pessoa com mais de 18 anos pode requerer ao cartório de registro civil de origem a adequação de sua certidão de nascimento ou casamento à identidade autopercebida.
Fonte: Da Redação
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