O ator John Cazale é dono de uma filmografia perfeita. Exagero? Pois, neste texto, você conhecerá uma lista curta, porem invejável. São apenas cinco filmes, com quatro coisas em comum:
– são obras-primas do cinema;
– foram lançados na minha década favorita do cinema: os anos 1970;
– todos indicados ao Oscar de Melhor Filme;
– todos foram abrilhantados pelo talento do ator americano.
Clube dos Cinco… clássicos
Nascido em Revere, Massachussets (EUA), em 12 de agosto de 1935 (faria 90 anos neste mês), John Holland Cazale mudou a intepretação no cinema, transformando-se no ator coadjuvante de luxo que mais roubava cena em filmaços. Contudo, seu tipo físico era de anti-galã: franzino, meio calvo, olhos fundos, com um quê de desajeitado. Entretanto, tinha um magnetismo que ninguém sabia explicar direito. Cria do teatro, ele levou esse poder às telas de cinema, após ser descoberto pelo cineasta Francis Ford Copolla, que o chamou para filmar um projeto muito arriscado da Paramount. Era nada menos que O Poderoso Chefão. Enfim, não poderia ter estreado melhor.
Copolla gostou tanto de trabalhar com Cazale que escreveu um papel especialmente para ele em seu projeto seguinte: A Conversação, um dos melhores filmes da década de 1970. Depois, o ator ainda trabalhou com os diretores Sidney Lumet e Michael Cimino. Paralelamente, retornou aos palcos e contracenou na peça Medida por Medida com uma jovem atriz chamada Meryl Streep. Ambos se apaixonaram, mas o romance durou pouco. Isso porque, aos 42 anos, Cazale foi diagnosticado com câncer nos ossos e faleceu em 13 de março de 1978, antes do lançamento de seu último filme.
Apesar da curta filmografia, John Cazale deixou um legado de papeis inesquecíveis, todos em clássicos do cinema. Uma carreira perfeita. Talvez, a mais perfeita que Hollywood já teve.
1 – O PODEROSO CHEFÃO (1972)

Em sua estreia espetacular no cinema, John Cazale interpreta Fredo, o filho mais avoado de Don Corleone. Festeiro e alheio aos negócios da família, seu personagem é aquele para quem ninguem liga na família, mas que sempre tenta provar seu valor. O ator empresta a Fredo sua carga boêmia da vida real (Cazale adorava paquerar, farrear e fumar várias carteiras de cigarro por dia), alem de um ar de fragilidade que tornaram o personagem único. É o maior papel de sua carreira, sem sombra de dúvidas. E ainda melhora em…
2 – O PODEROSO CHEFÃO PARTE II (1974)

Se no primeiro filme ele roubava cena, no segundo ele é uma das peças-chave para o avanço da família Corleone ao colapso familiar. Não, ele não é o vilão, mas torna-se o maior representante da ambiguidade moral dos personagens dessa continuação. Nada paga o desabafo de Fredo ao irmão mais novo (“Eu sou esperto, não sou como todos dizem”, lamenta), revelando sua mágoa por ser tão subestimado por todo mundo. Além disso, é dono de uma das cenas mais tristes da trilogia O Poderoso Chefão – presente no terceiro filme como flashback.
3 – A CONVERSAÇÃO (1974)

Na terceira parceria com Francis Ford Coppola, ele fez o parceiro – e o contraponto – de Gene Hackman na arte da escuta telefônica investigativa. Ambos estão investigando um casal de amantes, sendo que a mulher é esposa do contratante da investigação. O Stan de Cazale é carismático, falastrão e um pouco fofoqueiro, diferente do sério e sisudo Harry (Hackman). E, mais uma vez, ele assume a posição de integrante magoado, logo tornando-o ideal para fazer personagens subestimados. Mesmo com o roteiro focado no protagonista, sempre sentimos a ausência de Stan na tela. Imperdível.
4 – UM DIA DE CÃO (1975)

Minha interpretação favorita dele, que consegue a façanha de roubar a cena em um filme protagonizado por Al Pacino. Na obra de Sidney Lumet, ele interpreta Sal, o parceiro de assalto de Sonny (Pacino) e a personificação do perigo imprevisível. Nessa historia de um assalto que deveria ser simples, mas que ganha proporções inacreditáveis, John Cazale tem uma presença física marcante, perigosa e curiosamente engraçada. Quando Sal fala “Wyoming”, em um dado momento, é improviso do ator (logo, a reação do parceiro Al Pacino na cena é verdadeira), mostrando que seu personagem não poderia ser de outra pessoa.
Depois de Um Dia de Cão, ele retornaria aos palcos e conheceria o amor de sua vida: a atriz Meryl Streep.
5 – O FRANCO-ATIRADOR (1978)

O ator estava cuspindo sangue nos bastidores do filme de Michael Cimino. Quando o estúdio percebeu e quis deixá-lo de fora, Meryl Streep – que também estava no filme – bateu o pé e ameaçou sair da produção também. Preocupados, Cimino e o elenco combinaram de filmar as cenas de Cazale antes das outras, deixando a edição cuidar do resto. Infelizmente, o ator não conseguiu se ver em cena, pois faleceu antes do lançamento do filme. Streep estava a seu lado (como sempre esteve na doença) quando ele fechou os olhos para sempre.
Uma pena que ele tenha perdido sua terceira participação em um vencedor do Oscar de Melhor Filme. Afinal, O Franco-Atirador (que é um dos meus filmes favoritos) é um nó na garganta do espectador e um tiro no peito do patriotismo americano. A trama fala sobre um trio de metalúrgicos que vão para a Guerra do Vietnã e voltam traumatizados de lá. Cazale faz o amigo inconsequente do trio principal – liderado por Robert de Niro – e não demonstra nenhum traço de fraqueza (magro ele sempre foi).
Portanto, foi seu último papel em um grande filme, que finaliza uma sequência imbatível de grandes filmes. E ainda contracenando (e namorando) com a atriz mais linda de Hollywood, que demonstrou seu amor por ele da maneira mais bonita e humana possível. O câncer, enfim, foi sua única derrota.
Júnior Guimarães é jornalista e escreve a coluna Cinema em Tempo. Toda semana aqui no Roraima em Tempo temos uma análise sobre o mundo cinematográfico. No Youtube, Júnior tem um canal onde faz críticas e avaliações sobre cinema.

