O Brasil tem cerca de 14 mil pacientes com hemofilia, doença rara causada pela ausência de fatores de coagulação no sangue, o que provoca sangramentos frequentes, inclusive internos, que podem causar dor intensa, danos neurológicos e até a morte.
Embora o tratamento mais tradicional esteja disponível pelo Sistema Único de Saúde (SUS), muitos pacientes e cuidadores ainda enfrentam dificuldades para aplicá-lo em casa. O problema está apontado no Mapeamento da Jornada do Paciente com Hemofilia A e B no Brasil. Quem divulgou as informações foi a Associação Brasileira do Paciente com Hemofilia (Abraphem).
De acordo com a presidente da entidade, Mariana Battazza, a maioria das pessoas com hemofilia precisa receber infusões regulares de fator VIII ou IX para prevenir os sangramentos. No entanto, o medicamento é por via intravenosa e nem todas as famílias conseguem o procedimento em casa, especialmente em crianças pequenas.
A pesquisa
A pesquisa revelou que 59% dos cuidadores de crianças entre 0 e 6 anos não conseguem aplicar a infusão, o que obriga muitas famílias a buscar ajuda externa: 27% vão a unidades de saúde, 14% recorrem aos centros de tratamento de hemofilia e 18% contam com apoio de profissionais em domicílio. Mesmo os pacientes que realizam as aplicações em casa precisam se deslocar até o hemocentro para retirar o medicamento. Mais da metade deles (57%) vive a pelo menos 100 km da unidade, e o tempo médio por visita entre viagem e atendimento ultrapassa cinco horas.
Segundo Battazza, essa rotina compromete a autonomia das famílias e aumenta a sobrecarga dos cuidadores. “Qualquer imprevisto dificulta ainda mais o acesso. E se não houver hemocentro na cidade, o atendimento é em hospital, onde nem sempre os profissionais estão preparados para lidar com a hemofilia”, alerta.
Punção
Além disso, a maioria das crianças precisa passar por duas ou mais tentativas de punção. Isso até que a infusão tenha a correta aplicação, o que torna o processo ainda mais desgastante. A diretora da Supera Consultoria, Verônica Stasiak, responsável técnica pela pesquisa, ressalta o impacto emocional.
“A primeira infância é uma fase crítica no desenvolvimento físico, motor e cognitivo. Sem controle dos sangramentos, essas crianças correm risco de sequelas irreversíveis”.
Apesar da ampla adoção da profilaxia, os sangramentos ainda são frequentes. Quase 59% dos entrevistados relataram pelo menos três episódios no ano anterior à pesquisa, principalmente hemartrose – sangramento nas articulações. Como consequência, 71% dos adultos com hemofilia já apresentam alguma limitação de mobilidade, sendo que em 90% dos casos, a limitação é permanente.
A rotina também afeta diretamente as mulheres: 84% dos pacientes recebem os cuidados das mães, que acumulam responsabilidades com o tratamento e lidam com os impactos físicos e emocionais das sequelas.
Diante do cenário, a Abraphem cobra uma mudança no protocolo do SUS. A entidade pede que crianças menores de 6 anos tenham acesso ao emicizumabe, anticorpo monoclonal aplicado por via subcutânea e já utilizado por pacientes com resistência ao tratamento tradicional desde o ano passado.
Segundo Battazza, o benefício vai além do controle da doença: “Com um produto mais eficaz, a criança cresce com menos sequelas, precisa de menos internações, falta menos na escola e, futuramente, no trabalho. Isso se reflete em qualidade de vida e também em economia para o sistema público de saúde”.
A pesquisa, financiada pela farmacêutica Roche, fabricante do emicizumabe, não analisou o custo-benefício dos tratamentos. No entanto, 92% dos entrevistados disseram que gostariam de ter acesso a medicamentos menos invasivos.
Por fim, em nota, o Ministério da Saúde informou que os medicamentos são pela pasta e distribuídos gratuitamente aos centros de tratamento.
Fonte: Agência Brasil



