A Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood (HFPA), instituição do Globo de Ouro, vem passando por um inferno astral. Tudo porque, além da falta de diversidade no júri, uma denúncia do jornal Los Angeles Times descobriu uma mutreta de presentinhos com os produtores da série “Emily em Paris” (escrevi sobre isso aqui). O prestígio da instituição caiu a ponto do astro Tom Cruise devolver seus três Globos de Ouro. No ano passado, a premiação nem foi televisionada.
Como resposta, a HFPA está adicionando mais mulheres, membros internacionais e de outras etnias. Hollywood, porém, parece não ter desculpado a associação ainda. Isso porque os indicados ao Globo de Ouro 2023 foram anunciados ontem, segunda-feira, e a maioria dos indicados permaneceu em silêncio. Alguns agradeceram, como Hugh Jackman, indicado pelo filme The Son. Já Brendan Fraser, indicado por The Whale, avisou que não comparecerá na cerimônia.
Tendência evidente
Analisando os indicados (tanto para cinema quanto para séries), percebemos uma tentativa de se recuperar, com um foco maior nos sucessos. Nas categorias principais, temos as maiores audiências de setembro (Dahmer: Um Canibal Americano, em Melhor Minissérie), outubro (A Casa do Dragão, em Melhor Série de Drama) e novembro (Wandinha, em Melhor Série de Comédia).
No cinema, essa tendência fica ainda mais evidente. Afinal, para Melhor Filme de Drama estão indicadas a maior bilheteria do ano confirmada (Top Gun: Maverick) e a maior pretendida (Avatar: O Caminho da Água). Elvis também está no meio.
Os outros dois são os únicos que tem, digamos, “cara” de grande premiação: Tár e The Fabelmans. Esses dois, inclusive, vem faturando vários prêmios nesse início de temporada. Porem, não mais que Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, indicado a Melhor Filme de Comédia – e maior sucesso do estúdio A24.
Trapaça
A questão não é o merecimento dos filmes e séries acima, mas o dos que não foram indicados. Está certo que Station Eleven é do início do ano, mas custava se lembrar dela em Melhor Minissérie? Mesmo porque temos a mesma trapaça que aconteceu no Emmy, pois o Globo de Ouro também indicou a série The White Lotus (que tem até terceira temporada confirmada) como… minissérie!
Infelizmente, eu já esperava a ausência de Pachinko, o belo dorama do Apple TV+. Pelo menos, O Urso ganhou reconhecimento, embora eu não o veja como comédia – mas vou ficar quieto, já que o Critics Choice fez o mesmo direcionamento. Agora, cadê Reservation Dogs? E, principalmente, cadê Barry em Comédia e Euphoria em Drama?
Popularidade
As pistas para possíveis respostas estão nas “conversas” entre as categorias. Meu palpite? Barry saiu para dar lugar a Wandinha (que é mais popular). Euphoria e Pachinko saíram para deixar juntas A Casa do Dragão (que está com o “hype” lá no céu) e The Crown (que já seria indicada pelo prestígio, mesmo com uma temporada inferior). E, para não deixar The White Lotus de fora, burlamento de regras e migração para uma categoria diferente, já que não tinha como tirar Ruptura, Better Call Saul e Ozark.
Não teve essa confusão com os filmes, já que as comédias não foram atingidas pela busca por audiência. Tanto que Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo é o único com popularidade dos dois lados (crítica e público). Mesmo assim, não sinto nenhuma ausência importante. Por outro lado, Ela Disse e Entre Mulheres foram esnobadas como drama. Parece o mesmo problema de antes, não é? O que muda é a motivação interna. Desta vez, procura-se público e, logo, obras que o público assistiu.
Seguir o exemplo
A melhor lista, sem dúvida, é a de Melhor Animação. Primeiro porque só tem um representante da Disney, Red: Crescer é uma Fera, diversificando a concorrência. Segundo: as duas melhores animações do ano DE FATO estão aqui: Pinóquio por Guillermo del Toro e Marcel the Shell With Shoes On. De todas, é a seleção mais próxima do que pode ser no Oscar. A de Melhor Filme Internacional está quase assim – e também está muito boa.
Por isso que, apesar de algumas injustiças, não vou reclamar do Globo de Ouro. Já faz tempo, mesmo antes das polêmicas, que a HFPA não é copiada por outras premiações. Se bem que a edição do ano passado (a que não foi televisionada) acertou ao premiar Ataque dos Cães como melhor drama e Amor, Sublime Amor como melhor comédia ou musical. O Oscar deveria seguir o exemplo, ao invés de consagrar o só legalzinho No Ritmo do Coração.
Sim, ainda há esperança para o Globo de Ouro, mas não é pelos sucessos. É pelo anti-lobby. Espero que o HFPA continue repensando isso.
Júnior Guimarães é jornalista e escreve a coluna Cinema em Tempo. Toda semana aqui no Roraima em Tempo temos uma análise sobre o mundo cinematográfico. No Youtube, Júnior tem um canal onde faz críticas e avaliações sobre cinema.