Um estudo inédito feito pelo Instituto do Sono revelou que a insônia não é apenas um sintoma secundário da depressão, mas parte integrante da doença. A conclusão veio depois de os pesquisadores examinarem a relação entre o risco genético para problemas de sono e sintomas de depressão em uma amostra do Estudo Epidemiológico do Sono de São Paulo, com pessoas entre 20 e 80 anos.
Os participantes foram submetidos a avaliação clínica, polissonografia noturna completa e responderam a um conjunto de questionários sobre sono. Houve também coleta de amostras de sangue para extração de DNA e genotipagem dos voluntários, com o objetivo de calcular o risco genético dessas pessoas para problemas de sono e sintomas depressivos. Os resultados do estudo foram apresentados no Sleep 2024 no início de junho, nos Estados Unidos.
“A privação de sono de forma pontual não potencializa o desenvolvimento da depressão, mas a insônia, como um problema de sono crônico, sim. Já foi descrito que, em pessoas com sintomas depressivos graves, o fato de ter insônia estava relacionado com a falta de resposta aos tratamentos para depressão. Também já foi provado que pessoas com insônia correm mais risco de ter depressão no futuro”, disse uma das responsáveis pelo estudo, a pesquisadora Mariana Moysés Oliveira.
Origem
Conforme Mariana, as descobertas são inéditas. A insônia e os sintomas depressivos partem de origens genéticas muito parecidas. Por isso, não pode se tratar os problemas de sono como algo secundário em pessoas com depressão. Isso porque já que está demonstrado que são parte central da doença. Para chegar ao resultado, os pesquisadores aplicaram um modelo estatístico, chamado escore poligênico. Ele permite prever o risco para doenças complexas ao considerar milhares de variantes genéticas, o que permitiu estabelecer essa interrelação.
“A análise foi baseou-se em estudos de associação do genoma completo para depressão e insônia. Os resultados indicam que os escores poligênicos foram eficazes em alocar os indivíduos em grupos de alto e baixo risco para problemas de sono e depressão. Pessoas com má qualidade de sono tendiam a apresentar sintomas depressivos mais graves. Quanto maior o risco genético para queixas de sono, aumentava o risco genético para sintomas depressivos. Os genes que contribuíram para os escores poligênicos se sobrepuseram, indicando uma correlação genética forte entre essas condições”, destacou Mariana.
Saúde pública
De acordo com Mariana, os resultados podem ser úteis para a saúde pública. É que, por meio deles, é possível estabelecer políticas que promovam a identificação precoce. Assim, o tratamento integrado pode ser mais eficaz na redução da carga dessas condições na sociedade.
“Acredito que as pesquisas podem levar a novos protocolos clínicos que abordem de forma integrada a saúde mental e a qualidade de sono, abrindo caminhos para a pesquisa científica e permitindo uma compreensão mais profunda das causas desses problemas de saúde. Além disso, usar dados genéticos para prever a predisposição permite identificar pessoas em risco antes mesmo que os sintomas se manifestem”, afirmou a pesquisadora.
De acordo com a pesquisadora, a as doenças se manifestam geralmente por fatores genéticos, que não mudam desde a concepção, e ambientais aos quais as pessoas ficam expostas ao longo da vida. A pesquisa conseguiu calcular os riscos genéticos para então prever os riscos maiores ou menores para o desenvolvimento de uma doença. “Para doenças comuns, não conseguimos atribuir um único gene. Não existe o gene da depressão, da insônia ou do câncer. O risco genético é determinado por diversas, muitas vezes milhares de variações genéticas. Apenas quando avaliamos o conjunto dessas variações genéticas podemos calcular o risco genético”, salientou Mariana.
Conforme a responsável pelo estudo, com uma amostra epidemiológica é possível identificar variações genéticas que podem ser usados como biomarcadores de risco e, entendendo as conexões genéticas, é possível desenvolver tratamentos que atacam as causas das doenças, não apenas os sintomas, reduzindo a chance de recaídas.
Fonte: Agência Brasil