Se você é fã de “O Poderoso Chefão” (1972), com certeza já deve saber que a obra-prima de Francis Ford Coppola será relançada nos cinema em 2022. O motivo é a comemoração do aniversário de 50 anos do lançamento original. Sim, já faz meio século que o mundo viu: a) Don Corleone ser chamado para fazer justiça, fazer uma proposta irrecusável e sofrer um atentado na feira; b) seu filho Michael entrar e crescer no mundo do crime; e c) uma série de outras reviravoltas até um encerramento irretocável (e prossegue para outra história igualmente irretocável). Agora, o público atual pode ver tudo isso em alta definição, na versão a ser lançada em 24 de fevereiro de 2022 no cinema.
Estamos velhos
Ainda faltava mais de uma década para meu nascimento quando esse marco do cinema aconteceu. Mesmo assim, lembro-me das chamadas do filme nos comerciais da TV aberta, quando eu era criança. Se eu já considero isso muito tempo, imagine como está sendo para quem ASSISTIU a “O Poderoso Chefão” nos cinemas, cinquenta anos atrás. Por exemplo, quem teve essa honra aos vinte anos, enquanto estava pedindo a noiva em casamento, hoje está setentão, com uma penca de filhos e uma porrada de netos. É, amigos, estamos ficando velhos.
Entrou em pânico? Relaxa, pois vou piorar sua vida. Basta dar uma olhada em outras produções que também comemoram aniversário em 2022, em números redondos. Na verdade, já dá para se sentir velho quando descobrimos que a comédia “Superbad: É Hoje” completará 15 anos em alguns meses, assim como os neoclássicos “Sangue Negro” e “Onde os Fracos Não Tem Vez”. E quando sabemos que brasileiro “Cidade de Deus” e o primeiro “Homem Aranha” de Sam Raimi farão vinte anos. Pior: “Batman: O Retorno” e “Drácula de Bram Stocker” vão trintar e “Blade Runner” e “E.T: O Extraterrrestre”, quarentar.
Cinquentando
Por causa do gigantismo da saga da Família Don Corleone, os aniversários menos celebrados devem ser, justamente, de seus contemporâneos. Pior é que os outros cinquentões também são clássicos, como “Cabaret”, que deu o Oscar de Melhor Diretor para Bob Fosse (um absurdo, deveria ser de Coppola); “Amargo Pesadelo”, misto de aventura e thriller tenso de John Boorman; e “Aguirre: A Cólera dos Deuses”, uma pérola da parceria insana do diretor Werner Herzog e o ator Klaus Kinski. E nem falei dos cachorros grandes, como Federico Fellini (“Roma”), Luis Buñuel (“O Discreto Charme da Burguesia”), Ingmar Bergman (“Gritos e Sussurros”) e Bernardo Bertolucci (“O Último Tango em Paris”, cuja controvérsia com a atriz Maria Schneider o fez perder vários admiradores).
Caminhando para a velhice, faz aniversário de 55 anos o que talvez seja o ano mais agitado do século XX: 1967. Agitação essa que se refletiu no cinema e entregou obras que iniciaram a transição do cinema antigo para o moderno. São eles: “Bonnie e Clyde: Uma Rajada de Balas”, “À Sangue Frio”, “A Primeira Noite de um Homem”, “Rebeldia Indomável” e a trinca sagrada de Sidney Poitier: “Adivinhe Quem Vem Para o Jantar”, “Ao Mestre Com Carinho” e o vencedor do Oscar “No Calor da Noite” (um de meus filmes favoritos de todos os tempos). Enfim, já falei que estamos ficando velhos?
Os “cabeça-branca”
Sabe quem fará aniversário de SESSENTA anos em dezembro? “Lawrence da Arábia”, o maior de todos os épicos. Nem parece. Afinal, o clássico de David Lean continua cinema puro, mesmo visto depois de tanto tempo. O mesmo pode ser dito sobre o maior dos musicais: “Cantando na Chuva”, que faz SETENTA em março. O que pode parecer datado é “Matar ou Morrer”, obra-prima do western que preserva a estética-padrão da época, com a imagem em preto-e-branco e a sonoridade levemente abafada.
Chegando nos octogenários e ainda falando dos maiores de determinado gênero, teremos o niver de “Casablanca”, o maior dos romances (pensou que era “…E o Vento Levou”, não é?). Esse também tem rugas bem visíveis, mas ainda é muito bem escrito, romântico, doloroso e maravilhosamente interpretado por Humphrey Bogard e Ingrid Bergman. Por isso mesmo, é uma pena que a estética antiga afaste a geração atual, mais envolvida com imagem e som em alta definição que com um conteúdo de excelência. Felizmente, dá tempo de apresentar às crianças uma obra que vai celebrar 85 anos, fez história na Sétima Arte e está no catálogo do Disney+. Trata-se de (está sentado?)… “Branca de Neve e os Sete Anões”.
Respeito aos idosos
Falando em streaming, os serviços estavam mesmo nos devendo mostrar esses clássicos. O melhor nesse sentido parece ser a HBO Max, que tem no catálogo a filmografia da Warner Bros, um dos primeiros estúdios de Hollywood e dono de várias obras inesquecíveis. Algumas citadas acima, inclusive, estão lá, prontas para serem degustadas pelo público atual. E aí é que está: como convencer esse pessoal do que estão perdendo e que está, literalmente, na palma da mão?
Creio que a celebração de um aniversário seja o momento ideal. Os 50 anos de “O Poderoso Chefão” é só um deles. Seria justo também ver celebrações dos sessentões, setentões e oitentões. Claro que não dá para se lembrar de cada um deles, mas não dá para deixar de lado “Cantando na Chuva” (que tem na HBO Max) e “Lawrence da Arábia” (que tem uma versão dublada DE GRAÇA no YouTube). O respeito aos idosos também vale para os filmes. Estamos ficando velhos, mas é nossa missão manter a chama acesa e mostrar aos jovens por que esses clássicos são… clássicos.
Júnior Guimarães é jornalista e escreve a coluna Cinema em Tempo. Toda sexta-feira aqui no Roraima em Tempo temos uma análise sobre o mundo cinematográfico. No Youtube, Júnior tem um canal onde faz críticas e avaliações sobre cinema.