Híbrido, remoto e presencial: como o ensino durante a pandemia afeta alunos na rede estadual de RR

Mesmo com avanço da vacinação e baixa de casos, faltam reformas e transportes, como mostra a primeira matéria da série “Como Anda a Educação?”

Híbrido, remoto e presencial: como o ensino durante a pandemia afeta alunos na rede estadual de RR
Sede da Secretaria de Educação e Desportos (Seed) em Roraima – Foto: Fabrício Araújo/Roraima em Tempo

“Foi uma fase bizarra”, relembra o estudante Ismael Lima da Silva, de 16 anos, sobre o ensino remoto em Roraima. Ele é um dos alunos da escola Professor Severino G. Gonçalves Cavalcante, uma das 38 escolas estaduais na capital que retornaram às aulas presenciais em 09 de fevereiro.

Durante os anos de 2020 e 2021, as salas de aula se tornaram espaços dentro da casa de cada professor e aluno em razão da pandemia de Covid-19. Passado estes dois anos e mesmo com avanço da vacinação, o ensino segue de forma indefinida em Roraima.

Por falta de transporte, reforma ou precariedade, as aulas funcionaram de formas diferentes. Dezessete escolas iniciaram com ensino remoto, pois ainda precisavam de revitalização. Além disso, nas comunidades indígenas e nos municípios do interior, o governo adotou o formato híbrido entre presencial e remoto.

Atualmente, Ismael cursa o 2º ano e sente que “perdeu parte do ensino médio”. No entanto, ele pretende recuperar todo o conteúdo a tempo de fazer o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

“Estaria mentindo se dissesse que funcionou de forma perfeita. Teve muitas problemáticas em vários quesitos. A dificuldade em focar, a matemática se torna mais difícil do que o comum e eu nem sabia quem eram os meus colegas de classe”, descreveu Ismael sobre a experiência com educação remota.

Escola Severino G. Gonçalves Cavalcante, onde Ismael estuda, está com placa de identificação apagada e muro sem pintura

Para o professor adjunto de Pedagogia da Universidade Federal de Roraima (UFRR) e especialista em Educação Especial, Rafael Vilas Boas Garcia, o ensino remoto cumpriu um papel emergencial. No entanto, sobre o aprendizado dos alunos, as pesquisas ainda têm mais questões do que respostas, pois estão em fase inicial.

“As evidências que temos até agora apontam maior sofrimento psicológico, como ansiedade, depressão, isolamento, baixa motivação, desistência de atividades e cursos. Também há a questão de dificuldade de acesso, pois a pandemia impactou na questão socioeconômico das famílias”, explicou o especialista.

Questionado sobre a atual situação do ensino, o governo de Roraima respondeu que o ano letivo “iniciou no dia 07 de fevereiro no formato de aulas 100% presencial, em toda a rede”. A informação, no entanto, contradiz o que o próprio Estado havia divulgado quando as aulas retornaram (veja abaixo). Além disso, as aulas voltariam no dia 07, mas foram adiadas para 09 de fevereiro.

Para tentar driblar a falta de acesso a celular, computador e internet, a Secretaria de Educação e Desporto (Seed) chegou a distribuir apostilas para os estudantes. No entanto, as reclamações de que a medida era insuficiente e de atrasos nas entregas foi constante durante os anos de 2020 e 2021.

‘Meu rendimento caiu’

Em Roraima, há ao menos 11 colégios militarizados, que são vendidos como padrão pelo governo

Para Sabrina Lohany Alves do Nascimento, estudante de 16 anos, o ensino remoto teve mais problemas que soluções. Ela afirma que teve mais tempo para fazer pesquisas, em contrapartida quase não tinha como tirar dúvidas.

Ela estudava no Colégio Militarizado Professora Maria de Lourdes Neves, unidade administrada pela Polícia Militar e vendida como padrão pelo governo desde a gestão da ex-governadora Suely Campos (Progressistas).

Conforme Sabrina, a facilidade em buscar por assuntos por conta própria dificultava porque o número de atividades aumentava. O que a deixava sobrecarregada e fez até mesmo seu desempenho piorar.

“Meu rendimento escolar no remoto caiu bastante, porque o conteúdo era muito ‘jogado’. Os professores passavam, e só alguns faziam a vídeo aula com a gente pra podermos tirar dúvidas, os demais nós tínhamos que fazermos tudo baseado no que eles enviavam”, afirmou Sabrina.

Em nota, a Seed afirmou que com a retomada das aulas presenciais, as escolas estão aplicando avaliações diagnósticas. “A partir dos resultados, as escolas poderão elaborar planejamentos direcionados à recomposição das aprendizagens, que ficaram prejudicadas em razão da pandemia”.

No entanto, o sentimento de acumulo de atividades e mais trabalho não foi sentido só por ela. O pedagogo Rafael Vilas Boas Garcia afirma que as pesquisas já sugerem que professores também trabalharam mais.

“A pandemia de Covid-19 causou essa mudança na estrutura educacional, que foi prejudicial para os alunos e para os professores. As pesquisas apontam que as maiores queixas na percepção dos professores indicam que houve aumento da jornada de trabalho dos professores durante o ensino remoto”, explicou o professor adjunto da UFRR.

Casa, trabalho, escola, lazer…

Não só a estrutura da educação mudou durante o isolamento social. As casas passaram a ser o espaço para todo tipo de atividade do trabalho ao lazer, bem como um local de cuidados para familiares que eventualmente ficassem doentes.

Dessa forma, o pedagogo apontou que isto também contribuiu para queda de rendimento. Ele explica que às vezes era impossível um aluno se manter concentrado, ou mesmo participar na aula enquanto toda a família estava em casa fazendo outras coisas.

“Algumas limitações permaneceram, que já eram inerentes à pandemia e ao medo da Covid-19. Como o óbito de familiares, restrições e o isolamento, que foi um fator agravante para pessoas com deficiência intelectual ou autismo, por exemplo”, afirmou o Rafael Vilas Boas Garcia.

Além da limitação de espaço e tempo, ele reafirma que o acesso a equipamentos adequados e acesso a internet de boa qualidade também foram situações que dificultaram o aprendizado durante o ensino remoto em Roraima.

Como anda a Educação?

Mesmo com aulas em formato remoto por conta das reformas, escolas que passaram por recente revitalização ainda enfrentam problemas com a estrutura. A escola Lobo D’Almada, por exemplo, teve investimento de R$ 1 milhão, conforme afirmou o governador ao entregá-la em fevereiro.

Em menos de cinco meses alunos e servidores já precisam improvisar uma sala de estudos no auditório. Isto porque com as chuvas, o teto da sala de aula foi infiltrado e o espaço acabou alagado.

“Atualmente, 22 escolas entre unidades de ensino da Capital, do Interior e de Comunidades Indígenas estão recebendo reparos na estrutura física com obra de reforma geral ou serviço de revitalização”, afirmou a Seed em nota.

Na próxima reportagem da série “Como Anda a Educação?” o Roraima em Tempo explica mais sobre a estrutura e reformas nas escolas em Roraima.

Após reforma, alunos da Escola Estadual Lobo D'Almada estudam em auditório devido infiltração
Unidade foi reformada e entregue em fevereiro – Foto: Arquivo pessoal

Fonte: Da Redação

Veja também

Comentários

Subscribe
Notify of
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments
0
Would love your thoughts, please comment.x